domingo, 4 de maio de 2008

Copos de café meio vazios...


Durante dias e dias não consegui escrever uma só palavra! Hoje, a velha máquina de escrever do avô guarda uma quantidade absurda de disparates. São 04 da manhã. Eu insisto que tenho que bater um novo recorde, "maior número de parvoíces que alguma vez foi escrito". E batalho arduamente contra o sono que insiste em vencer-me neste braço de ferro desigual! Ele está claramente em vantagem. O café acabou, o escuro do quarto dá-lhe uma pequena vantagem! Eu resisto...Voltei a lembrar-me do meu avô! Até à poucos anos atrás era ele quem vagueava pelos escuros corredores da casa da porta preta (era assim que a minha irmã lhe chamava ou melhor, não era bem preta...era mais peta. Naquela altura ela ainda não dizia bem as palavras... o nome ficou). Ele sofria de insónias. Eu lembro-me das noites dos meus primeiros anos naquela casa...achava que era assombrada! A história dos fantasmas acabou por durar mais do que a do pai natal...enfim! Mas, voltando às insónias do meu avô...
Até à bem pouco tempo atrás, as minhas insónias acompanharam as do avô! As minhas insónias de férias eram passadas a discutir cinema, guerras, política e Mozart. Sentada numa das poltronas de couro da velha biblioteca, com uma chávena de chá a acompanhar e, o gira discos muito baixinho, a libertar as notas do trompete do Miles Davis, falávamos sobre os meus sonhos e, discutíamos uma série de disparates! Eu perdia sempre, mas nunca me cansava! O meu avô acabava sempre a chamar-me "Naive"!... Ele ensinou-me muitas coisas..de qualquer forma...se estas discussões "ocupadoras de insónias" persistissem....tenho a certeza que acabariam da mesma forma..."eu seria sempre Naive"!
Hoje, sou eu quem vagueia pelos escuros corredores da casa da porta preta. Às vezes ainda volto à biblioteca. Pego num livro, ligo o gira discos e as notas do Miles voltam a ocupar aquele espaço onde outrora reinaram as discussões sobre assuntos parvos...Agora, só eu, o Miles e uns dias Dostoievsky, outros Virgínia Wolf, não raras vezes, convido Saramago (aprendi a gostar...foi preciso algum tempo. Se calhar estou a crescer).

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